segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

ENTREVISTA: Navalha

Nova cara do Navalha (esq. p/ dir.): Raquel Elmescany (teclados), Murilo Frazão (bateria), Lucas Pinto (guitarra), Cláudio Fly (baixo), Andrey Moreira (guitarra) e Eric Alvarenga (vocal)

A banda Navalha surgiu em 2010 e já é considerada uma das melhores bandas de metal alternativo (ou como queiram chamar) na nossa cidade. A estreia da banda se deu em uma edição de 2010 do Fabrikaos. Depois a banda deu uma pequena parada, e voltou com força em 2012, lançando o CD “O Instinto”. Agora, a banda chega com novidades, como a força extra no line up com a entrada da tecladista Raquel Elmescany, uma das melhores no estilo. 

Nas próximas linhas, alguns dos integrantes, Andrey Moreira (guitarra), Eric Alvarenga (vocal), Lucas Pinto (guitarra) e a própria Raquel nos falam da banda, da cena local, de seus outros trabalhos e até do produto que mais combina com o metal: a cerveja. 

Completam o time: Claúdio Fly no baixo e Murilo Frazão na bateria. Com vocês, estreando a seção ENTREVISTAS no Caldo de Crânio: NAVALHA.


Eric Alvarenga (vocal):

O Navalha quando surgiu pegou muita gente de surpresa misturando o estilo de metal arrastado e pesado, mas com vocais limpos, quase falados, e com letras em português. A ideia era essa mesma? Chocar? Ou foi apenas um resultado de outras influências que receberam? E quais seriam essas influências?

= A ideia era tentar construir algo diferente mesmo. Nós sabíamos que ia ser um tanto chocante para algumas pessoas ouvirem um som mais pesado, esperar um vocal mais agressivo e perceber que ele não vinha. Ainda hoje algumas pessoas ainda chegam para nós sentindo esta falta, mas esse estranhamento é bom. Ele ajuda a criar algo mais singular. Tem várias bandas que gostamos que seguem esse caminho como o Katatonia, Porcupine Tree e até os trabalhos mais recentes do Opeth. É até por buscar um tipo de som com mais singularidade que recentemente chamamos a Raquel Elmescany pra tocar teclado na banda. Ela vai nos ajudar nesse objetivo.

Você é o letrista da banda. Há diferença no conteúdo das mensagens do Navalha para outra banda que você participa, no caso, o Aeroplano? Você já cria pensando em que banda ela vai ser musicada ou você cria a letra e depois escolhe para que banda ela vai?

= Tem diferença sim. O Navalha tem uma atmosfera mais obscura nas letras. Tento usar algumas palavras que combinam mais com o clima da banda, que é este algo mais cinzento, escuro, melancólico e agressivo. No Navalha sempre faço as letras por último. Primeiro vem os arranjos e a melodia, depois tento escrever algo.


Raquel Elmescany (tecladista):

Você participou de bandas expressivas da cena metal local, sendo a principal delas o grande Tenebrys, de doom gothic metal. Após sua saída da banda (numa reunião com um clima tão sombrio quanto o seu som), você ficou um tempo longe de tocar em bandas autorais. O que levou a aceitar o convite para voltar a tocar em uma banda de metal?

= Tudo o que ocorreu com o Tenebrys foi muito traumático pra mim. Eu fiquei com tanto receio de voltar a tocar que o meu teclado ficou em cima do guarda-roupa por mais de seis meses. Quem me estimulou a voltar foi o meu namorado, o Zé Lucas, rs, depois que recebi um convite pra tocar na Vinttage (banda de pop rock cover do Yuri Martins, Paçoca, Mitsuru Yamada, Thales Campêlo e Thiago Souza). Era uma liga mais cover, a responsabilidade de produção não era minha, e devo a eles o meu retorno à música. Aliás, a Vinttage está voltando pra eventos fechados tb, rs.

Mas eu ainda estava muito arisca a bandas autorais, pois ainda temia muito as responsabilidades inerentes as mesmas. Eu não tinha mais energia pra correr atrás das coisas como antes. Tinha medo de quebrar a cara.

No meio do caminho, me envolvi num projeto de prog metal que não deu certo, o que piorou as coisas dentro da minha cabeça. Veio o ano do tcc (2012) e eu achei melhor me concentrar nos estudos. Mas daí o Navalha me convidou pra gravar uma música com eles (A Calma) e eu curti muito o som. Acabou que a faculdade estava exigindo muito de mim, e eu não consegui o tempo pra fazer essa gravação.

Mas essa idéia ficou na cabeça, e quando eu fui assistir o Navalha no Studio Pub, nossa, minha cabeça explodiu! Achei o som dos caras demais. Acho a voz do Eric fantástica, e o clima atmosférico das músicas, sem perder o peso do metal, me lembrou Alcest. Apaixonei-me pela banda, e me arrependi muito de não ter gravado com eles, mas eu realmente não tinha como. Eu tinha passado em um concurso e tinha que terminar a faculdade o mais rápido o possível, sob pena de perder a vaga.

Mas tudo deu certo, e agora estou com mais tempo livre pra tocar. O Navalha é uma banda que eu curto muito, e quando recebi o convite do Andrey, eu fiquei muito feliz! Até falei no ensaio (propaganda do Fábrika Studio kkk) que acho que eles não tem idéia da complexidade harmônica das músicas que compõem. É algo guiado por instinto, e quero muito absorver isso pro meu estilo de composição. A técnica te deixa meio bitolado, e você esquece de sentir a música às vezes. E eu acho que sentir a música deve ser o mais importante na hora de compor. Por isso que entrei na banda, porque considero os caras muito bons. E além disso, são gente boa, o Andrey é um cara muito prestativo, e ainda tem um cervejeiro (Lucão) na banda!!! O que mais eu poderia querer?

Voltando ao Tenebrys, a banda teve um fim, digamos assim, prematuro. Há chances de um retorno da mesma?

= Aproveitando a deixa, algo me emocionou muito em 2013. Eu já tinha recebido convites espalhados pelo tempo pra voltar ao Tenebrys, mas nada conseguia me convencer de que seria uma experiência agradável. Eu até aceitaria gravar uma música ou duas, mas o clima da banda estava perdido pra mim há muitos anos. Eis então que a única pessoa que não trocou um “oi” comigo durante todos esses anos veio falar comigo. O Luciano (guitarrista e compositor principal do Tenebrys). Eu quase não acreditei que ele queria mesmo falar comigo, porque ele simplesmente sumiu! Pensei que ele não queria me ver nem pintada de ouro, ou algo assim. Mas o Mauro Seabra (baterista do DNA, antigo produtor musical do Tenebrys) me disse que ele queria transformar o Tenebrys em um projeto com vários convidados, e que queria me chamar pra ser membro efetivo. Eu sinceramente fiquei muito feliz dele ter essa consideração por mim, e meio receosa por tudo que aconteceu, mas aceitei ir tomar um café com ele. Nesse dia, ele me disse tudo o que sentia, conversamos muito, e para minha surpresa, ele estava muito emocionado. Na verdade, ele não tinha falado comigo por vergonha e remorso. E eu todo esse tempo achando que o cara me odiava. Rs. Pareceu cena de novela.

Então eu aceitei entrar no projeto, já estamos compondo, e em breve haverá novidades sobre a volta do Tenebrys. O Luciano está construindo um estúdio massa, e ele está se dedicando muito a isso no momento, mas estamos ansiosos para terminar a primeira música dessa nova fase. E o Mauro está nos produzindo de novo, devo dizer que ele sempre foi um cara genial, em breve vamos reunir pra trabalhar nas músicas. Estou muito feliz por esse retorno :)


Lucas Pinto (guitarra):

Você toca em outra banda da nova safra da cena rocker paraense, A Válvula. Na sua opinião, qual a diferença entre tocar o stoner rock / hard rock da sua outra banda e o metal em português que o Navalha faz?

= Não há diferença para mim. Tocar em ambas me satisfaz de maneiras diferentes, já que gosto de ambos os estilos, mas na mesma proporção.
Na Válvula eu estive presente praticamente desde seu início e vejo que talvez as músicas e mensagens sejam mais palatáveis ao público, mais fáceis de se escutar. É Rock'n roll, afinal.
No Navalha eu entrei recentemente, e antes disso era mais um fã declarado tanto da banda quanto das pessoas que a compõe, quase todos amigos com um excelente histórico musical. Nessa banda eu escuto uma música mais densa e reflexiva; mais “moderna” no final das contas, sendo que nem sei se dá pra classificar como metal.

Desenvolves algum tipo especial para tocar em ambas? Ou deixas fluir o que vem na cabeça em qualquer uma que seja?

= Como não tenho formação musical as composições e estilos de tocar acontecem de maneira bastante empírica mesmo. No meu dia a dia escuto corriqueiramente bandas que se adequam tanto às vertentes vinculadas à Válvula quanto ao Navalha, de modo que quando as ideias surgem já há um direcionamento mental até mesmo involuntário para a adequação daquele riff ou sugestão à cada projeto.
O que é positivo em ambas as bandas é a liberdade musical existente, já que apesar do enquadramento no hard/stoner rock à Válvula e do metal alternativo ao Navalha, ambas as bandas flertam com diversas outras influências, afinal tudo é mutável.

Recentemente começastes à trabalhar na produção de cervejas. Achas que pode ser um mercado promissor dentro do universo do rock, tipo, fabricando cervejas de bandas locais, assim como algumas bandas lá fora já fazem?

= Talvez seja um pouco cedo pra dizer que “comecei a trabalhar na produção de cervejas”. O adequado é dizer que comecei a me dedicar a (mais) um hobby; e esse hobby tem me trazido bons feedbacks e realizações, principalmente porque meu início na vida de cervejeiro caseiro veio acompanhada da criação da AcervA Paraense – Associação dos Cervejeiros Artesanais, da qual integro a Diretoria e, mesmo no nosso pouco tempo de vida, estamos conseguindo excelentes resultados na difusão da cultura cervejeira, sendo mais um elemento na já existente revolução e conscientização de consumo de um modo geral.
Quanto a ser um mercado promissor, a cerveja de verdade (artesanal, especial, premium, gourmet, ou qualquer que seja o adjetivo escolhido) está em franca ascensão mundial. No Brasil, apesar do lag de aproximadamente 10 a 20 anos se compararmos à revolução cervejeira estadunidense, o mercado desse tipo de cerveja cresce vertiginosamente, e em patamares que superam em três vezes ou mais o dos grandes grupos transnacionais como AMBEV e KIRIN.
Especificamente quanto à associação da cerveja com o rock, esta é quase instantânea. Diversas bandas já utilizam disso pra lançar seus produtos (AC/DC, Iron Maiden, Deep Purple, Kiss, Motorhead, recentemente o Mastodon, dentre outras; a nível nacional: Sepultura, Velhas Virgens, Ultraje a Rigor, Nenhum de Nós, Korzus, Titãs, Raimundos, Paralamas do Sucesso, Angra, Matanza) e pra mim, quando comecei a pensar nas minhas receitas foi muito natural aplicar isso à nossa realidade e desenhar cervejas à algumas bandas da nossa cidade que curto e admiro.
Na verdade, mais do que um apelo mercadológico, é necessário aproximar esses produtos do público de destino, tanto pela informação quanto pelo preço. Cerveja é bebida democrática, inclusiva, e agregadora e assim deve permanecer. No Brasil, a consequência dos altos preços das cervejas deságua num engatinhar de um movimento de elitização da cerveja do qual discordo bastante. A cerveja é para todos, inclusive para Belém, inclusive para nossas bandas. Cerveja é rock! E a cerveja que eu hoje faço em casa não é nada mais do que aplicação do velho jargão punk do “do it yourself”.


Andrey Moreira (guitarra):

Defina o Navalha em poucas palavras.

= Navalha é um banda que mistura alguns elementos que eu gosto muito, como instrumental pesado regado à afinações baixas e vocais melódicos, com letras fortes que abordam temas do cotidiano da vida moderna, como medos, transtornos, violência, dependência afetiva, amor, etc, mas de um jeito não muito direto. É engraçado como cada pessoa tem uma ideia diferente sobre as letras.

Você participou da banda Caustic, talvez a grande percussora do estilo new metal em Belém. Ao resolver montar uma nova banda, anos depois, qual o motivo de não seguir o mesmo caminho da banda anterior?

= O Caustic foi uma grande banda, fico muito feliz com o carinho dos fãs até hoje, mas quando você monta uma banda nova, você deve seguir outros caminhos, arriscar-se, até pra evoluir como músico. Quando eu montei a banda, já me arrisquei chamando um cara que é de uma banda Pop Rock (Aeroplano). Sempre gostei do trabalho deles e foi perfeito. O Eric Alvarenga é um grande compositor, transformou as melodias vocais em ótimas letras e deu o tom certo de como deveria ser o vocal do Navalha. Falando na formação atual, cada um trouxe elementos novos e influências pra banda, como o Lucas Pinto que trouxe bom gosto em arranjos e timbres matadores de guitarra, Claudio Fly com linhas de baixo bem trabalhadas, Murilo Dantas com peso e técnica na bateria e agora a novata, Raquel Elmescany, com uma infinidade de possibilidades musicais nos teclados/keytar/sintetizadores, que está nos levando a outro nível de composição. Hoje em dia quando faço uma música, por exemplo, eu já penso: essa parte fica perfeita pro Fly fazer tal linha de baixo. Cara isso é bem legal, pois quase sempre eles fazem melhor do que eu imaginei e sou muito feliz de tocar com pessoas tão talentosas que te forçam a ser um melhor músico.

Alguns falam (na minha opinião, erroneamente), que aquele período, que o Caustic existiu, seria a "era de ouro" do rock local. Você concorda com isso? Como você vê aquela cena e a atual?

= Eu acho que em termos de público foi a melhor época. Vi o Ginásio Altino Pimenta, African Bar, Centur, cheios pra ver somente bandas locais, cito esses por serem locais grandes. Hoje em dia é notório que o público está mais restrito e difícil, às vezes inexplicavelmente, como o grande revés que o Pitiú Festival teve, coisa que me deixou bem triste, foi um grande passo atrás para o sonho de termos grandes festivais de ROCK PESADO aqui. Acho que foi um baque muito forte pra cena e não coloco a culpa nos organizadores do festival nem no público, pra falar a verdade nem sei o que acontece nesses casos, hoje em dia as bandas locais estão mais profissionais, pois temos bandas fazendo turnê fora do pais, gravando bons CD's, fazendo ótimo material de divulgação, fotos promocionais, clipes, até show em DVD e documentário sobre a cena tem.
Eu vejo a cena atual como a de melhor safra de bandas que o Pará já teve (minha opinião), o que é muito bom, pois mostra nossa evolução, mas com um público que pouco conhece as bandas locais. É incrível como tem pessoas que ainda tem um preconceito com as bandas daqui, mas não conhecem o Molho Negro, Avens, Scream of Death, A Red Nightmare, All Still Burn, Telaviv, Aeroplano, Elder effe, Ut Opia, The Baudelaires, A Válvula, Bruno B.O. fora os medalhões como Deliquentes, Madame Saatan, Retaliatory, entre outros, pode até soar como sacanagem citar certas bandas com tantas outras muito boas, mas o meu ponto é que tem uma infinidade de bandas legais aqui, pra todos os gostos, e o público pouco conhece, falo isso sem colocar a culpa só no público, nós enquanto bandas também temos nossa parcela de culpa. Mas às vezes é falta de oportunidade, tipo a música "Bazar" do Aeroplano que foi a mais tocada em dezembro na Radio Cultura; o Wael Daou que está concorrendo a MELHOR GUITARRISTA NACIONAL pela ROAD CREW; e eu fico pensado quantos músicos/ bandas daqui não estariam fazendo bonito se tivessem mais oportunidades?

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